Introdução
Foram 21 semanas de preparação. Já há muito tempo que não
fazia um plano de treino tão longo, mas desta vez justificava-se. As maratonas
anteriores foram mal planeadas. Pouco adequadas, ao trabalho, às motivações, à
idade e um sem número de outras coisas. Consequências? Várias… entre elas algumas lesões frustrantes. Por
esta razão, decidi que que este plano teria de ser muito progressivo e aberto a
todas as adaptações que o corpo pedisse. Num período de quase 5 meses, treinei com muitas pessoas e falei das minhas expetativas com muitas mais. É
com vocês todos que partilho este meu pequeno relato, sobre a Maratona de
Amesterdão, pois de uma ou outra forma foram importantes neste meu caminho.
Antes de tudo
Está prova começa no Natal de 2014 quando a Carmen me
oferece como presente de Natal a inscrição na maratona de Amesterdão de 2015.
Fiquei muito feliz. Sempre foi uma prova que quis fazer e ir-me-ia permitir
conhecer uma cidade que há muito desejava conhecer.
Entretanto estava em processo de
treino para a maratona de Sevilha em fevereiro deste ano. O treino estava a
correr mal… lesões, falta de tempo,
falta de vontade, falta de motivação… tudo estava lançado para que o “desastre“
acontecesse… é assim foi… terminei-a, mas em mau estado físico e mental. Imediatamente
decidi que na próxima teria de ser diferente.
Para começar tinha que haver ter uma cenoura maior (motivação).
Foi fácil… iria retomar o objetivo de fazer mínimos para Boston. Já os tinha
atingido há uns anos atrás, mas devido a razões económicas não consegui fazer
na altura a viagem até Boston.
Para ir a Maratona de Boston, já só me poderia inscrever em
2016 para fazer a prova em abril de 2017. Nessa altura já estarei no escalão +55 anos sendo o mínimo para este escalão mais conforme com as minhas reais possibilidades (3h40m). É certo que desde novembro 2012 que não fazia uma marca inferior
aos mínimos.
Alcançar os mínimos é possível? Claro que é.... difícil? claro que sim... então… mãos à obra.
Round 1 - MARATONA DE AMESTERDÃO
A primeira tentativa para
Boston seria em outubro de 2015, para me poder inscrever em setembro de 2016, para correr em abril de 2017. Uauuuuu…
isto sim é um plano a médio prazo
E lá fui eu fazer o meu plano… para 18 de outubro de 2015.
Treino
Fiz um plano de 20 semanas (começaria a 1 de junho) mas tinha
uma semana zero, ou seja, na verdade planei 21 semanas. Era um plano moderado com
subidas muito ligeiras de quilometragem/intensidade e com períodos de descanso.
Teria de cumprir parte dele em férias, o que era mais uma dificuldade a somar às diferentes fases do trabalho, às férias de família, e a
temperatura (treinar essencialmente no verão em Portugal nem sempre é uma tarefa
fácil de realizar). Mas com a ajuda dos astros tudo se conjugou.
Corrida WeRun - A primeira prova no plano de treino |
Como é normal em tantos km’s de treino (foram 1037km em mais
de 94h) houve momentos fantásticos e outros menos bons. Mas como diz um amigo meu
“… faz parte”. Mas o melhor de tudo é que a maior parte das passadas foram
feitas na companhia de amigos, amigos que chegam pela corrida, mas que ficam
por tudo o resto. E mesmo quando corri sozinho os corredores e os menos
corredores lá estiveram ajudando-me a cada minuto.
Um bom treino com o Paulo e o Duarte |
O treino correu quase sem percalços. Exceção feita ao
dia 24 de setembro, quando num treino de séries (10x800mts) no início da nona série
o meu adutor da perna direita deu de si… uma micro rutura obrigou-me a estar
parado durante uma semana. Foi um pequeno susto. Depois os treinos recomeçam
ligeiros e tudo se recompôs.
fotos do ultimo longão (35km) que não fiz devido à lesão |
Esta micro lesão teve o condão de aumentar o tempo
tapering de 3 para 4 semanas o que no final até foi bom (o tempo de paragem, ou
diminuição da carga, deixa sempre ansiosos os maratoneiros – pois peçam que os
km’s que realizaram não são suficientes).
Antes da prova
O último treino foi feito na quarta-feira antes da prova, um
feito a solo nas imediações de casa a ritmo de recuperação onde me senti
muito pesado, o que também é normal, mas que provoca uma sensação desconfortável
e logo nos leva a questionar “como eu vou consegui fazer a Maratona no
domingo?”
Tirei uns dias de férias pois queria conhecer a cidade. Partimos na sexta-feira de madrugada (5h – como custou)- Aproveitamos o dia para ir à feira da Maratona levantar os dorsais visitar um museu e começar a fazer o “enchimento“ de hidratos de carbono. Coitada da Carmen no sábado já não podia ver mais Italian food.
Na feira da Maratona |
esforçasse demasiado as minhas pernas.
Autoretrato de Van Gogh |
Equipa Amesterdão |
Agora tinha que descansar… mas antes disso a foto de praxe na noite anterior.
A prova começava às 9h30 estando hospedado a 15 minutos (tempo
de caminha) do local de partida. Acordei às 7h30, para um pequeno-almoço ligeiro e sai de casa pelas 8h30. Numa
caminhada tranquila aos poucos e poucos, de todo o lado, foram aparecendo os
meus “adversários”, a temperatura estava fresca (7ºC) mas tolerável pois não
havia vento. O drop off das roupas foi muito fácil e extremamente organizado. Tinha
combinado encontrar-me, nesta zona, com o meu amigo Pedro Oliveira (com quem
tantos treinos/provas fiz no passado) que estava também em Amesterdão para
fazer de lebre, mas não conseguimos. Fiquei triste, mas pensei que mais à
frente talvez o encontrasse. Às 9h rumei em direção ao interior do estádio. Um
ambiente muito bom.
Drop-off das roupas |
Eu estava a cerca 150 metros da meta, quando a partida foi dada fui caminhando até 50 metros da mesma e a partir dai comecei a correr logo ao ritmo que desejava. De todas as maratonas que fiz esta foi aquela onde nunca senti que ninguém me estava a atrapalhar nem vice-versa.
A minha partida |
Nos dias que antecederam a prova elaborei um plano de ritmos que me ajudasse a orientar a prova. O plano tinha duas visões. Na primeira faria toda a prova a ritmo regular de 5:13/km e o segundo a um ritmo irregular. Sei por experiência que normalmente o meu ritmo é irregular e tem um split positivo, ou seja, faço a primeira meia-maratona mais rápida do que a segunda.
tempos de passagem planeados para a prova |
Aproveitando a “boleia” dos portugueses parti ligeiramente
rápido. Os primeiros 5km foram muito fáceis e a passagem a ritmo regular de
5:02/km fez com que ficasse com 31s de avanço ao previsto. Os dois pontos altos
desta parte do percurso foram a passagem pelo Vondelpark, o maior parque
publico de Amesterdão com 48 hectares cheio de árvores, lagos, caminhos e
campos de jogos e por dentro do Rijksmuseum, a famosa passagem que liga o
centro da cidade com o sul de Amesterdão.
Vondelpark |
Rijksmuseum |
A partir daqui fomos em direção ao rio Amstel. Esta parte rural do percurso, com cerca de 12km, tem uma esplêndida vista panorâmica com muitas belas mansões e antigos moinhos de vento. O rio estava cheio de atividades. Por volta do Km 15 o meu companheiro de partida continuou a um ritmo mais rápido do que eu poderia ir... então comecei a resguardar-me. Ao km 15 ia com 2:02 acima do inicialmente previsto. E lá continuamos bem-dispostos gozando as vistas do percurso rural. Passamos à meia-maratona em 1:45:29 bem acima do inicialmente previsto (2:16).
Quando saímos da zona do rio (por volta do km 25) encontramos
novamente a minha claque da qual recebi um novo folego. Agora sim.. a corrida
começava. Sabia que os 2:41s ganhos até aqui seriam essenciais para o resto do
percurso onde de certeza entraria em perca maior do que aquela prevista no meu
plano. Mesmo assim o pico de tempo gando em relação ao previsto deu-se ao km 33 onde atingi 3:00 de avanço.
A partir daí comecei em queda e nos últimos km’s perdi cerca de 45s.
A partir desta zona começou o verdadeiro trabalho da lebre começou... falava de tudo o que se lembrava para não me deixar concentrar no desconforto da dor. Até ao km 40 não cai muito.
Um pouco antes deste ponto encontrei o meu amigo Pedro Oliveira, que tanto procurei à partida. Foi o meu ultimo doping. Foi com alegria imensa que me detive uns segundos a abraça-lo. Bem-ditos segundos.
O encontro com o Pedro Oliveira |
Os últimos metros |
Cortar a meta |
“O valor das coisas não está no tempo que elas duram, mas na intensidade com que acontecem. Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis!”